O cancro do colo uterino, com 135 casos diagnosticados, durante o primeiro semestre deste ano, ocupa o segundo lugar na lista das doenças cancerígenas no país, revelou, ontem, em Luanda, a directora clínica do Instituto Angolano de Oncologia.
Sales Cândido, que falava no quadro das campanhas do Outubro Rosa, mês dedicado ao combate ao câncer, referiu que 32 pacientes com problemas de cancro do colo uterino, morreram, no período em análise.
Em 2019, o Centro Nacional de Oncologia diagnosticou 267 casos de cancro de colo uterino, o que resultou em 49 mortes. Em 2020, foram 180 novos pacientes detectados e 37 óbitos, enquanto que no ano transacto registou-se 184 doentes, dos quais 43 acabaram por morrer.
De acordo com a directora clínica, tal como no cancro da mama, em regra, o tratamento do câncer do colo uterino também é cirúrgico, mas, se estiver já muito avançado, faz-se antes sessões de quimioterapia e radioterapia, para se reduzir a extensão do tumor e só depois acontece a cirurgia.
Em função disso, a médica defendeu a importância da realização regular dos exames de “papa Nicolau”, por permitirem detectar algumas lesões na parede do útero e dar-se tratamento de forma precoce, ainda com o ginecologista, evitando, assim, a evolução da doença para cancro.
Neste momento, segundo Sales Cândido, o cancro do colo uterino é somente superado pelo câncer da mama, que lidera a lista com 178 casos diagnosticados, durante o primeiro semestre deste ano, originando 26 mortes.
A especialista em Oncologia Clínica sublinhou que a maior parte das pacientes que aparece em consultas detectou, durante o auto-exame da mama, algum caroço ou sentiu dor continua nos seios.
“Elas chegam aqui para saber o que se passa e, depois dos exames, acabam por receber o resultado de que o cancro já está avançado”, explicou a médica, para realçar que, dificilmente, aparecem pacientes nas consultas de oncologia, sem sentir algo nas mamas.
Por isso, Sales Cândido apelou para as mulheres terem a cultura de realizar o auto-exame da mama, por ajudar a notar alguma coisa, ainda que pequena, e começar-se a fazer o tratamento de forma precoce.
Outros casos de cancros
Além do cancro da mama e do colo uterino, o Instituto Nacional de Oncologia diagnostica outros tipos de doenças cancerígenas, com destaque para o da próstata, sarcoma de capose, tumores da pele, gastrointestinais, hematológicos e tumores pediátricos.
Em relação ao cancro pediátrico, Sales Cândido sublinhou que os mais comuns são os nefroblastomas (tumores renais), os tumores do sistema nervoso central, dos ossos, leucemias e linfomas, estes últimos, os mais registados na faixa etária infantil.
Sobre o cancro da próstata, a oncologista clínica disse que, em 2019, diagnosticou-se 64 casos, em 2020, foram 50 pacientes e, em 2021, registou-se 34 pacientes. Adiantou que o atendimento de poucos doentes deve-se à falta de mais especialistas em Urologia no instituto.
Nesta matéria, a directora clínica frisou que o instituto possui apenas um médico urologista, e este profissional sozinho não tem capacidade para atender a procura. Por isso, a unidade aconselha alguns pacientes a fazerem consultas de urologia em outros hospitais, para rastrear o cancro.
“Caso dê positivo, é feito uma biopsia e dar-se o tratamento cirúrgico nessa unidade sanitária alternativa e seguir com o tratamento de quimio e radioterapia no Instituto Nacional de Oncologia”, explicou.
Problemas da próstata em pessoas mais jovens
O cancro da próstata é uma doença que acomete mais os homens, a partir dos 40 anos, mas a médica revelou que o problema já tem afectado pessoas mais jovens, na sua maioria, por razões hereditárias.
“Se o pai ou avó teve cancro da próstata, as chances do filho ou neto de vir a ter a doença são enormes, assim como o problema surge, por norma, mais cedo em relação aos progenitores”, esclareceu.
Neste sentido, aconselhou aos homens, a partir dos 40 anos, a começarem a fazer exames da próstata com regularidade, para se afastar qualquer possibilidade de cancro.
País tem falta de tecnologia
Questionada se no país já é possível fazer os testes genéticos para descartar a possibilidade de se desenvolver cancro no futuro, Sales Cândido respondeu negativamente.
“Angola ainda não tem condições criadas para o efeito, daí precisar-se de um trabalho muito mais aturado, para termos laboratórios com tecnologia de ponta”, disse a directora clínica do Centro Nacional de Oncologia.
Por esta razão, a médica aconselha aos pacientes com possibilidades financeiras e com histórico de cancro na família a realizarem os referidos testes no exterior do país.
Avançou que, caso os testes darem positivos, os mesmos fazem os procedimentos necessários e evitam que o cancro se desenvolva, principalmente quando nos referimos ao câncer da mama, colo uterino e do ovário.
Factores de risco
A directora clínica do Instituto Nacional de Oncologia considerou que o cancro de mama é causado por alterações genéticas, directamente relacionadas à biologia celular, que podem ser estimuladas por factores ambientais, como o tabagismo, uso de harmónios (TRH- terapia de reposição hormonal) por tempo prolongado, obesidade e alcoolismo.
Já para o cancro do colo uterino, os factores de risco são a menarca precoce (é quando a primeira menstruação vem muito cedo, antes dos 8 anos), menopausa tardia e ter o primeiro filho depois dos 35 anos.
A directora clínica do Instituto Nacional de Oncologia apontou ainda a infecção pelo Papiloma Vírus Humano (HPV), infecção por clamídia, uso prolongados de pílulas anticoncepcionais e múltiplas gestações como outros factores que contribuem para o cancro uterino.
Programa de combate aguarda aprovação das autoridades
O Instituto Nacional de Oncologia elaborou um Programa Nacional de Combate e Controlo do Cancro, já entregue às autoridades competentes e aguarda apenas por aprovação.
Sobre o programa, a médica explicou que está prevista a criação de uma zona para o rastreio dos cancro uterino e da mama em todas as unidades de saúde do país.
Sales Cândido avançou que o projecto contempla, igualmente, a expansão dos serviços de oncologia em outras províncias do país, para evitar que pacientes de outras regiões sejam obrigados a se deslocar a Luanda. Também faz parte do projecto a administração regular da vacina HPV em meninas que ainda não tenham começado a vida sexual, para prevenir cancro do colo uterino.
A médica explicou que o HPV é um vírus de transmissão sexual. Por isso, a vacina deve ser dada às meninas que ainda não tiveram o contacto sexual.
Sales Cândido referiu que, há cinco anos, a vacina HPV já foi administrada a jovens mulheres, num projecto realizado pela Maternidade Lucrécia Paim. “Mas, por motivos desconhecidos por nós, as coisas terminaram”.
Dada a importância dessa vacina, a médica defendeu que esta campanha de vacinação de meninas deve retomar, no sentido de se proteger o maior número de mulheres possíveis contra o cancro do útero.
E a responsável considera que o Outubro Rosa é um bom período para reforçar essas campanhas de vacinação e de consciencialização das mulheres e da sociedade em geral sobre a importância da prevenção e do diagnóstico precoce do cancro da mama e do colo do útero.
Este período é celebrado, anualmente, com o objectivo de se compartilhar informações e promover a consciencialização sobre a doença, proporcionar maior acesso aos serviços de diagnóstico e de tratamento e contribuir para a redução da mortalidade por cancros.